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DIREITO DE RETENÇÃO DO AGENTE DE NAVEGAÇÃO/TRANSPORTADOR MARÍTIMO

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DIREITO DE RETENÇÃO DO AGENTE DE NAVEGAÇÃO/TRANSPORTADOR MARÍTIMO

 

O direito de retenção pode ser definido como a faculdade que é conferida ao legítimo detentor de uma coisa, móvel ou imóvel, de recusar a restituição dessa mesma coisa àquele que tem o direito de a exigir, enquanto este não cumprir a correspectiva obrigação que tem para com aquele.

Nos termos do artigo 755º nº 1 alínea a) do Código Civil, o transportador goza do direito de retenção sobre as coisas transportadas, pelo crédito resultante do transporte.

A este respeito, adiante o nº 2 do referido artigo que, quando existam transportes sucessivos, mas todos os transportadores se tenham obrigado em comum, entende-se que o último detém as coisas em nome próprio e em nome dos outros.

O Decreto-Lei 352/86, de 21 de Outubro, que disciplina, em regime subsidiário, o contrato de transporte de mercadorias por mar, estipula, no seu artigo 21º nº 1 que «O transportador goza do direito de retenção sobre a mercadoria transportada para garantia dos créditos emergentes do transporte» (sublinhado nosso).

Significa isto que o transportador marítimo goza de um direito de retenção sobre mercadorias por si transportadas para pagamento dos créditos emergentes daquele específico transporte, e não outro qualquer, obviamente, anterior.

O exercício deste direito de retenção presupõe que o transportador notifique o destinatário ou consignatário da intenção de tal exercício nos quinze dias imediatamente após a chegada do navio ao porto de descarga, devendo porpor a competente acção judicial no prazo de trinta dias após a realização desta notificação.

Acontece que o Decreto-Lei nº 264/2012, de 20 de Dezembro, que estabelece o regime jurídico do acesso à actividade de agente de navegação, vem dispor, no seu artigo 4º alínea b) que é direito do agente de navegação assumir, em nome próprio ou em nome dos seus clientes, toda e qualquer forma legítima de defesa ou de protecção dos interesses correspondentes, nomeadamente as relativas à retenção de navios ou de cargas por créditos seus ou dos seus clientes sobre o dono, destinatário ou interessado no navio ou na carga a reter.

Ora, uma leitura menos atenta ou uma interpretação literal do referido preceito, poderia levar-nos a pensar que, afinal, o direito de retenção do agente de navegação incide sobre créditos emergentes de qualquer transporte e não apenas do transporte a que o crédito respeita.

Porém, não é este o nosso entendimento, pelas razões que passamos a explicar. Em primeiro lugar, porque o referido artigo 4º alínea b) fala de qualquer forma legítima de defesa. Ora, o exercício do direito de retenção só é legítimo quando respeite a créditos emergentes do transporte relativo à mercadoria retida, conforme dispõe o artigo 21º do DL 352/86, que estabelece o regime do contrato de transporte de mercadorias por mar. Depois, porque, se assim fosse, estaríamos perante uma desigualdade absolutamente inaceitável no caso, remoto, do transportador marítimo actuar directamente, isto é, sem intervenção de Agente de Navegação, pois apenas poderia exercer o direito de retenção sobre créditos emergentes daquele concreto transporte, enquanto se actuasse através de um agente de navegação o pudesse fazer relativamente a créditos emergentes de qualquer transporte.

Em jeito de conclusão, entendemos que deve ser feita uma interpretação restritiva do artigo 4º alínea b) do Decreto-Lei nº 264/2012, no sentido de se considerar que só é legítimo o exercício do direito de retenção do agente de navegação por créditos emergentes do transporte sobre a mercadoria a reter.

 

Jorge Urbano Gomes

Sócio da Gomes, Ferro, Barbosa Martins – Sociedade de Advogados, RL

jug@gfbmadvogados.pt

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